O dia em que precisei da lista

 

Foto: arquivo pessoal

Tem dias, dias desses que a gente fica meio esquecida, que a gente precisa fazer umas listas.
Lista disso, lista daquilo.
Lista pendurada aqui e acolá.
Mas tem dia que a lista não é para lembrar do que fazer, ou do que precisa comprar, ou do que não conseguiu fazer, ou do que decidiu adiar.
Tem dia que a lista é pra gente.
Pra gente olhar pra dentro.
Pra gente lembrar de quem é.
Hoje foi o dia em que precisei da lista.
A lista que me lembraria de quem sou. Que me lembraria do que acredito. Que me lembraria do que aprendi. E que me lembraria do tanto, tanto, tanto, tanto (e leia-se tantos tanto quanto o infinito puder expressar) do que eu ainda não sei. E do que eu nunca vou saber. Porque não vai dar tempo.
Essa lista me lembrou também de que, já que tem tanto tanto que eu não sei, tanto mais tem o que desejo, anseio saber.
A lista, é a lista dos nomes, daqueles que vieram antes, junto e que sempre estarão comigo. A lista daqueles que me fizeram e fazem e farão ser quem eu sou. 
A lista daqueles que me fizeram, fazem e farão crer.
A lista daqueles que me ensinaram, ensinam e ensinarão.
A lista dos que me compõem, dos que me sustentam, dos que não me deixam desistir, dos que me lembram sempre de tantas coisas que eu não posso e nunca irei esquecer.
Vygotsky. Luria. Leontiev. Piaget. Wallon. Freud. Lacan. Hannah Arendt. Bourdieu. Passeron. Bernard Lahire. Joan Scott. Maria da Graça Setton. Michael Apple. John Dewey. Michel Foucault. Émile Durkheim. Max Horkheimer. Tolstói. Dostoievski. Kafka. Albert Camus. Marx. Phillipe Perrenoud. Jostein Gaardner. Miguel Arroyo. Tomaz Tadeu da Silva. Ivor Goodson. Michael Young. Juarez Dayrell. Yves de La Taille. Telma Vinha. Lajonquière. Michael Fullan. Andy Hargreaves. Robert Sternberg. Bernard Charlot. Adolfo Sánchez Vázquez. José Mário Pires Azanha. Leda Mariza Fischer Bernardino. Maria Montessori. Ítalo Calvino. Lewis. Freire. Anísio Teixeira. Demerval Saviani. Darcy Ribeiro. Moacir Gadotti. Delia Lerner. Emilia Ferreiro. Roxane Rojo. Telma Weisz. Stella Miller. Bernard Schneuwly. Joaquim Dolz. Magda Soares. Maria Teresa Esteban. Ilma Passos Veiga. Sergio Roberto Costa. Maria do Céu Roldão. Marcuschi. Luckesi. Jussara Hoffman. José Pacheco. José Carlos Libâneo. Luiz Carlos Freitas. Vitor Paro. Antoni Zabala. Sérgio Haddah. Maria Clara Di Piero. Florestan Fernandes. Fanny Abramovich. Carolyn Edwards. Lella Gandini. George Forman. Sonia Kramer. Débora Vaz. Lita Clara Chastan. Chimamanda Ngozi Adichie. Amanda Lovelace. Magali Aparecida Silvestre. Isabel Solé Gallart. Maria de Fátima Carvalho. Marcos Cezar de Freitas. BRASIL.
Tudo lido, muitos no original, em línguas que muitas vezes eu não entendia, mas queria e me esforçava pra entender. Porque cada língua tem suas marcas, suas palavras que só nessa língua querem dizer o que querem dizer. Quando não dava, tradução. Tradução do original, tradução do pesquisador, tradução do jeito que desse.
Afinal, a tradução final de todas essas leituras quem fazia mesmo era o meu coração. E a minha mente. E eita mente que borbulha. Que pensa, que tem sede, que sempre quer mais.
Mente que tem medos, inseguranças, sonhos, certezas, incertezas e opinião.
Mas, depois de precisar da lista, que alívio me trouxe a lembrança de encontrar-me entre aqueles que me entendem e me aceitam como sou.
E que sabem, que a minha opinião, não é, na verdade, bem uma opinião.
Por que quem sou eu para achar alguma coisa? 
Que fato, dados, anos de trabalho, suor, pesquisa, escrita, reescrita, crítica, aula, edição, tenho eu, diante das trajetórias e brilhantes descobertas e contribuições dos nomes que estão para sempre gravados nessa pequena lista de quem guardo em meu coração?
Quem sou eu, perto desses colossais?
Minha opinião não é minha. 
É deles.
E de tantos outros que não estão registrados aqui. Porque não cabe. Porque não lembro. O porquê, tanto faz!
Obrigada por me lembrarem. Por estarem sempre comigo. Por me ajudarem. Por me iluminarem. Por me transformarem. Por me fazerem mudar de opinião tantas e tantas vezes. Por me provarem que eu não sei nada. Por me provarem que há jeito de aprender de tudo. Por me trazerem esperança, sempre que me sinto perdida ou esqueço quem eu sou. Necessidade de autoafirmação. Todos temos, nem sempre conseguimos lidar. Essa é minha forma de me respeitar. De me resguardar. De me reencontrar. Sempre que for preciso.
Porque não tenho vergonha de me perder. De errar. De mudar. De me enfrentar.
Tenho medo de morrer.
De desistir.
De estagnar.
Obrigada, especialmente, meu caro Vygotsky, porque foi você quem disse que nós somos seres sócio histórico culturais. E que tudo bem cada um pensar de um jeito, e ver de um jeito, e ser de um jeito e tudo bem. Ser de um, ou de outro, ou de vários jeitos ao mesmo tempo. 
Obrigada, por você ter me ensinado que cada um é de um jeito porque cada um tem sua história. Obrigada por me fazer entender e aceitar a minha.
Lista, queridos e queridas: vos amo.

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